segunda-feira, 8 de novembro de 2010

“Eu sei que a gente se acostuma.
Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em
apartamentos de fundos
e a não ter outra vista que não
as janelas ao redor.
E porque não tem vista, logo se
acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora,
logo se acostuma a não abrir de
todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas,
logo se acostuma a acender cedo a
luz.
E à medida que se acostuma, esquece
o sol, esquece o ar, esquece a
amplidão”.

(Clarisse Lispector)

Portanto, vamos nos desacostumar a acostumar com a rotina,
que vezes é reducionista com a vida.
Inventemos novos estilos de viver,
que sejam potentes, amplos e autônomos.

Amém.
Nós, os investigadores do conhecimento, desconhecemo-nos. E é claro:
pois se nunca nos ‘procuramos’, como nos havíamos de nos ‘encontrar’

(Nietzsche)

olho poético

'Sou vazio intenso.
sou unha encravada pintada de vermelho,
sou a asa de uma galinha voadora míope,
a artéria do meu namorado,
a ponta do lápis quebrado,
o ponteiro do relógio apressado.
Sou o lugar nunca visitado,
o lençol ensanguentado,
a mosca varejeira da sopa do meu pai,
e o ácaro do rosto do meu irmão,
a obturação do dente esquerdo de minha mãe.
Sou um lego desmontado.'

(produzido na Feira Poética UFRJ-2010)
Há um liame profundo entre os signos, o acontecimento, a vida, o
vitalismo. É a potência de uma vida não-orgânica, a que pode existir
numa linha de desenho, de escrita ou de música. São os organismos
que morrem, não a vida. Não há obra que não indique uma saída
para a vida, que não trace um caminho entre as pedras.

(Deleuze,1992)